Após duas semanas de intenso noticiário sobre o estupro coletivo sofrido por uma adolescente no Rio de Janeiro, o caso segue repercutindo em veículos midiáticos de todos os portes. No início da semana, o periódico Expresso Catarinense, distribuído na região da Grande Florianópolis, abordou o tema em coluna assinada pelo proprietário do jornal. O texto e o título ("Suposto estupro coletivo de garota carioca vira assunto nacional") provocou indignação entre leitoras.
Na coluna, o empresário, colunista e também jornalista responsável pela publicação mantém a dúvida sobre a tese de estupro que caiu por terra nos primeiros dias após a denúncia do fato, junto com o delegado inicialmente encarregado do caso, Alessandro Thiers. "O estupro aconteceu. A prova foi colocada nas redes sociais e a polícia comprovou a sua existência", observa a professora da UFSC e integrante da Casa da Mulher Catarina, Jane Maria de Souza Philippi.
Jane Maria de Souza Philippi/ Arquivo pessoal |
O texto reproduz o nome completo da adolescente, expondo a vítima à execração pública, ignorando o princípio da proteção integral invocado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. Em mais uma clara tentativa de manipular a opinião popular, exibe fotos da vítima portando armas, imagens atribuídas ao perfil pessoal da adolescente em rede social e que circularam pela internet. Não há foto de nenhum dos 33 acusados do crime.
A 4ª Promotoria de Justiça da Comarca de São José garante que a identidade de todo/a menor deve ser resguardada, o que faz com que a maioria dos casos envolvendo crianças e adolescentes tramitem em segredo de justiça, mas esclarece que apenas poderá se manifestar após analisar a denúncia. Catarinas também entrou em contato com o Sindicato dos Jornalistas do Estado de Santa Catarina, que mantém comissão de ética permanente para avaliar eventuais violações ao código de ética da categoria, mas ainda não recebeu resposta.
“Papel da imprensa é esclarecer e não julgar”, diz conselheira do CEDIM/São José
O autor da coluna utiliza argumentos que procuram descredibilizar a vítima. Um deles é o de que a adolescente havia usado drogas antes do estupro coletivo. “O uso de drogas não é desculpa para os crimes cometidos pelos homens e também não deve ser também motivo para culpar as vítimas. Além disso, está sob investigação a possibilidade dela ter sido drogada contra a sua vontade”, alerta Jane Philippi. A professora pretende debater a abordagem feita do periódico ao tema junto ao Conselho Municipal dos Direitos da Mulher de São José (CEDIM), onde é conselheira.
O autor da coluna utiliza argumentos que procuram descredibilizar a vítima. Um deles é o de que a adolescente havia usado drogas antes do estupro coletivo. “O uso de drogas não é desculpa para os crimes cometidos pelos homens e também não deve ser também motivo para culpar as vítimas. Além disso, está sob investigação a possibilidade dela ter sido drogada contra a sua vontade”, alerta Jane Philippi. A professora pretende debater a abordagem feita do periódico ao tema junto ao Conselho Municipal dos Direitos da Mulher de São José (CEDIM), onde é conselheira.
A leitora e integrante da União Brasileira de Mulheres Simone Lolatto observa que o texto insinua que as reiteradas relações sexuais da adolescente com mais de trinta homens teriam sido consentidas, já que a vítima afirmou em depoimento que já praticou sexo grupal consensual. "O sexo grupal é visto como um fetiche comum para os homens, mas as mulheres que assumem praticar ou gostar desta prática são ilegitimadas. É como se uma coisa justificasse e permitisse a outra. Sexo consensual e estupro são coisas bem diferentes", analisa. Para ela, o texto da coluna é carregado de profundo machismo.
“No Brasil, a cada 15 segundos, uma mulher é vítima de violência; a cada 2 horas uma brasileira é assassinada e dois milhões de mulheres são agredidas anualmente. 65% dos ataques a mulheres são cometidos por seus companheiros ou ex-companheiros e 69% das agressões contra mulheres ocorrem dentro de casa. Esse é o Mapa da Violência no Brasil e a imprensa tem a obrigação de esclarecer e prevenir esta situação brasileira terrível. Não é seu papel julgar antes do inquérito policial e da decisão judicial”, afirma Jane Philippi.
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