quarta-feira, 6 de julho de 2016

Editorial: O novo caso RBS e a naturalização do machismo

Fotos: Reprodução TVGlobo


Na semana passada, a denúncia da violência sofrida por Luíza Brunet suscitou, dentre as repercussões, a expectativa da impunidade. É recorrente o comentário de que o processo contra o agressor acusado é infrutífero, já que Lírio Albino Parisotto é bilionário, um dos homens mais ricos do mundo, o político mais endinheirado do Brasil, ​um dos maiores investidores do mercado financeiro, ​industrial petroquímico poderoso e, não menos importante, recente proprietário dos veículos de comunicação da RBS Santa Catarina.

Naturalmente, os holofotes se voltariam para um caso em que o agressor ostenta um currículo como este e a vítima é Luíza Brunet. Mesmo os veículos da RBS foram levados a noticiar o fato, ainda que com eufemismo atípico. O que chama atenção na nota divulgada pelo bilionário e repercutida pelos jornais foi o tom de surpresa. Nela, Parisotto lamenta a divulgação do que reduziu a “um fato ocorrido na intimidade”. Como se a agressão equivalesse a um copo quebrado na sua cozinha. Algo que diz respeito a ele, apenas. A denúncia de Luíza o pegou desprevenido e permitiu que se "metesse a colher" no fato que ele considerou privado.

A motivação da agressão foi ciúme, segundo relato de Luíza; álibi que também é batido e está entre os mais recorrentes entre as justificativas para os casos de agressão envolvendo cônjuges. Sempre é importante lembrar que namorados, noivos, maridos ou pessoas com quem as vítimas se relacionaram representam 67% dos agressores nos 63 mil casos denunciados à Secretaria de Políticas para as Mulheres nos primeiros dez meses do ano passado.

Lírio Parisotto desaparece no meio dessa estatística. Faz parecer que nem seria necessário contar com o escudo da sua posição social, econômica e política, trunfos caros e que muitos reservam para crimes que a sociedade considera "mais graves". Talvez, precisasse recorrer a um deles se fosse menor de idade, como o filho do antigo dono da RBS, Sérgio Sirotsky. Ao responder pela acusação no caso do estupro ocorrido há seis anos, o adolescente chegou a declarar na internet a confiança na própria impunidade. Não é possível saber se, ainda que não fosse filho de quem é, teria contado com a parcimônia do delegado que conduziu o caso: mesmo diante da confissão, o delegado afirmou não poder comprovar o estupro por que “não estava no local”.

​O fato é que a naturalização do machismo​ é reiterada todos os dias e conta com apoio transversal das esferas públicas. Talvez o poder político e econômico ​lhe sirva como blindagem ext​ra, mas Parisotto não precisa de toda a sua fortuna ou da influência ​direta que lhe prevalece. Basta contar com a conivência da cultura machista perpetuada cotidianamente também por jornais como os que mantêm colunas "sociais" onde se exibe diariamente corpos femininos seminus e tratam as mulheres como beldades, adornos e, em última instância, ​propriedade dos homens.

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